sábado, 12 de dezembro de 2009

TLECUANTLAPCUPEUH



Morena de Guadalupe,


Maria do Tepeyac,


congrega todos os povos


na estrela do teu olhar.


(D. Pedro Casaldáliga)






Nesta data os cristãos católicos de tradição romana e os das tradições ortodoxas celebram a Festa de Nossa Senhora de Guadalupe, Mãe dos povos da América Latina e Protetora dos Direitos Humanos.

A história começa no México, em 1531. Os espanhóis, à custa de muito sangue e terror, tinham se apoderado das terras do povo Asteca, destruído boa parte de seus templos e os mantinham praticamente escravizados. As revoltas dos Astecas eram frequentes. Apesar disso, um certo número de astecas havia se convertido à religião dos dominadores.

Um desses convertidos, chamado a partir do batismo de Juan Diego, em 9 de dezembro de 1531, dirigia-se, cedo, a Tlatelolco (Cidade do México). No caminho, ouviu cantar no alto da pequena colina do Tepeyc a melodia de diversos pássaros, na direção de onde sai o sol. Ouviu que o chamavam de lá. Subindo à colina deparou-se com uma belíssima mulher asteca, "sua roupa parecia o sol e lançava raios". "Inclinou-se diante dela, ouviu seu pensamento e sua palavra sumamente recriadora, muito enobrecedora, como algo que atrai e procura amor".

"Então ela conversou com ele e lhe revelou sua preciosa vontade. Disse-lhe: 'Sabe e guarda seguro em teu coração, filho meu o mais desamparado, que eu sou a sempre Virgem, Santa Maria, Mãe do Deus de Grande Verdade, Teótl, Daquele por quem vivemos, do Criador de Pessoas, do Dono de tudo o que está Próximo e Longe, do Senhor do Céu e da Terra. Quero muito e desejo vivamente que neste lugar construam minha casa. Nela mostrarei e darei às gentes todo o meu amor, minha compaixão, minha ajuda e minha defesa. Porque eu sou a Mãe Misericordiosa, tua e de todas as nações que vivem nessa terra, que me amem, que me falem, me busquem e em mim confiem. Ali hei de ouvir seus lamentos e prover remédio e curar todas as sua misérias, penas e dores'".

Atendendo ao pedido dela, Juan Diego procura o Bispo, D. Zumárraga, que não lhe dá crédito. Num segundo encontro com a Senhora no Tepeyac, ela pede a Juan Diego que volte ao Bispo e insista. O Bispo continua não lhe dando crédito e, para se ver livre, pede uma prova. Informada da exigência de Zumárraga, a Virgem promete ao índio que lhe dará a prova para o Bispo no dia seguinte, 12 de dezembro.

Era inverno e o Tepeyac estava coberto de neve. Mesmo assim, ao chegar ao topo da colina no dia marcado, Juan Diego a encontra coberta de roseiras floridas, rosas de Castela. A Senhora, que mais tarde vai se identificar como Tlecuantlapcupeuh ("Que vem da luz, como a águia vem do fogo"), diz-lhe para colher as rosas. Ela mesma as arruma na manta do índio e ordena-lhe que as leve ao Bispo, pois desta vez ele acreditará.

Zumárraga estava com visitas e escravos na sala quando Juan Diego chegou. Depois de muita demora, vendo que o índio não iria embora enquanto não fosse recebido, atendeu-o. Juan Diego abre diante do Bispo a manta deixando cair as flores enquanto o bispo e os presentes se ajoelham terrivelmente espantados. Ali, diante deles, na manta desenrrolada do índio começou a aparecer a imagem da Mulher da qual o índio se dizia mensageiro. Isto, e não as rosas, era a prova!

Zumárraga mandou construir a ermida no monte Tepeyac. Lá manteve exposta a manta com o ícone de Tlecuantlapcupeuh, que ele chamou de Guadalupe, pois a sonoridade do nome na lingua asteca - náhuatl - era semelhante ao nome de uma imagem negra da Virgem, venerada na Espanha.

Durante muito tempo milhares de astecas realizaram romarias diárias ao monte Tepeyac, pois entendiam que a deusa Coatlicue, a Terra-Mãe, carinhosamente chamada de Tonantzin, havia retornado ao seu templo no alto da colina - que Zumárraga mandara destruir assim que chegou ao México.

O ícone estampado na manta é de uma mulher asteca, vestida com as cores da família imperial asteca - turquesa e rosa-salmão -, com o manto estampado de estrelas e tendo o sol atrás de si. A mulher está grávida, conforme indica o laço abaixo do seio, usado pelas mulheres astecas durante a gestação. Chama a atenção a suavidade, a infinita serenidade e cordialidade da expressão.

A história da Virgem de Guadalupe está contada num texto em idioma náhuatl escrito poucos anos depois das aparições por um frade asteca, que teria ouvido o relato do próprio Juan Diego, chamado NICAN MOPOHUA ("Aqui se narra, em ordem..."). É uma obra-prima de poesia. Os textos acima entre aspas são desse relato.

O Ícone encontra-se exposto na Basílica de Guadalupe, no México, admiravelmente conservado. Sem qualquer tratamento, o tecido não apodreceu e a imagem resistiu a quase 5 séculos de exposição à chuva nas procissões, à fumaça incessante de velas dos milhares de devotos, ao ácido nítrico derramado por descuido durante uma limpeza, a uma bomba que explodiu diante do altar em frente ao ícone em 1921, durante um atentado: tudo ao redor ficou destruído - inclusive o grande crucifixo de bronze ficou inteiramente retorcido. Um estudo realizado pela NASA não encontrou marcas de pincéis na figura e constatou que o material da "tinta", não é de origem mineral ou vegetal ou de qualquer produto químico conhecido. O ícone de Guadalupe permanece um enigma.

A veneração em torno da Virgem de Guadalupe inspirou lutas de libertação do povo asteca e, no séc. XX, nas décadas de 70 e 80, alimentou a espiritualidade libertadora das Comunidades de Base na América Latina. Foi dessa forma que a devoção começou a se popularizar no Brasil.

* Para conhecer o relato completo do NICAN MOPOHUA acesse o link:
http://www.4shared.com/file/196071773/669af0cf/NICAN_MOPOHUA.html

Um comentário:

  1. História míticas são sempre bem elaboradas, artísticas e poéticas. Nunca tinha lido algo sobre esta figura, embora ouvisse sempre, principalmente em novelas mexicanas - é eu assisti "A usurpadora", Maria do Bairro etc...". De parabéns a iniciativa de expô-la. Bacana o BLOG, vejo que está iniciando!

    SUCESSSO!!! tô seguindo, conte comigo!

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